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Laboratório Experimental de Tecnologias Livres em Ubatuba/SP.
Atualizado: 41 minutos 55 segundos atrás

Pixelache - Helsinque, Finlândia

seg, 18/03/2013 - 12:04

No fim do ano passado, a plataforma Pixelache abriu chamada para receber propostas de programação para a edição de 2013 do festival de mesmo nome que acontece no mês de maio. Articulei um plano de participação junto à rede bricolabs, e fomos selecionadxs.

O evento acontece entre Helsinque, na Finlândia, e a ilha Naissaar, ao lado de Tallinn, na Estônia. O tema deste ano é "facing north/facing south". Com esse mote, a rede bricolabs posicionou-se de maneira crítica em relação ao sentido usualmente reconhecido das iniciativas de "cooperação internacional". Em geral, espera-se que o norte ofereça conhecimento, recursos e produtos; enquanto o sul entra com mão de obra, recursos naturais e mercados consumidores. O que sugerimos é que, dentro dos temas que nos dizem respeito, esse movimento não segue sempre a mesma direção. Trouxemos à discussão a imagem das redes profundamente ressonantes - nas quais a localização de cada integrante é somente um dos elementos que surgem, e nem de longe o mais importante. Consigo pensar em um monte de exemplos em anos recentes de ações efetivamente colaborativas que subvertem o sentido desses fluxos. Outro tema que surgiu, como também em outros projetos em que estou envolvido atualmente, foi a ideia de colaboração antidisciplinar. Na verdade, vejo um paralelo entre a colaboração ressonante (que ignora fronteiras geográficas) e a antidisciplina (que ignora fronteiras disciplinares). Tenho tentado escrever sobre isso, vamos ver se as coisas aparecem.

Estamos construindo nossa programação entre um grupo de pessoas em pelo menos seis países diferentes (às vezes mais: as reuniões semanais por IRC não têm um grupo fechado). Por enquanto, os planos são os seguintes:

  • Uma mostra sobre bricotecnologia: coisas feitas com as mãos, ou usando tecnologias abertas, ou que embutam processos abertos de desenvolvimento. Havia uma chamada por contribuições aberta até a semana passada (mas dá pra esticar um pouquinho mais, manda lá!)
  • Um seminário de um dia (em 17 de maio) com paineis sobre tecnologias livres, apropriação crítica, translocalidade e outros temas.
  • Sessões remotas no mesmo dia, com gente participando de diversas localidades no mundo (quer armar um grupo ou participar? me avise!).
  • Workshops e grupos de trabalho mais espontâneos durante o Camp Pixelache que acontece em Naissaar. O Camp está aberto a propostas de participação, mande lá.

O processo de planejamento e preparação para o programa Bricolabs do Pixelache tem sido muito rico. Além da oportunidade de reaproximar integrantes da Bricolabs, percebi em ambas as redes e aquilo que fazemos aqui no Brasil muitos assuntos em comum (uma olhada rápida no site deles mostra uma visita a uma recicladora de lixo, encontros para recuperar equipamentos, e por aí vai). Quem sabe começamos a pensar em um evento aqui em Ubatuba ligado à rede Pixelache para o futuro...

No fim do ano passado, a plataforma Pixelache abriu chamada para receber propostas de programação para a edição de 2013 do festival de mesmo nome que acontece no mês de maio. Articulei um plano de participação junto à rede bricolabs, e fomos selecionadxs.O evento acontece entre Helsinque, na Finlândia, e a ilha Naissaar, ao lado de Tallinn, na Estônia. O tema deste ano é "facing north/facing south". Com esse mote, a rede bricolabs posicionou-se de maneira crítica em relação ao sentido usualmente reconhecido das iniciativas de "cooperação internacional". Em geral, espera-se que o norte ofereça conhecimento, recursos e produtos; enquanto o sul entra com mão de obra, recursos naturais e mercados consumidores. O que sugerimos é que, dentro dos temas que nos dizem respeito, esse movimento não segue sempre a mesma direção. Trouxemos à discussão a imagem das redes profundamente ressonantes - nas quais a localização de cada integrante é somente um dos elementos que surgem, e nem de longe o mais importante. Consigo pensar em um monte de exemplos em anos recentes de ações efetivamente colaborativas que subvertem o sentido desses fluxos. Outro tema que surgiu, como também em outros projetos em que estou envolvido atualmente, foi a ideia de colaboração antidisciplinar. Na verdade, vejo um paralelo entre a colaboração ressonante (que ignora fronteiras geográficas) e a antidisciplina (que ignora fronteiras disciplinares). Tenho tentado escrever sobre isso, vamos ver se as coisas aparecem.Estamos construindo nossa programação entre um grupo de pessoas em pelo menos seis países diferentes (às vezes mais: as reuniões semanais por IRC não têm um grupo fechado). Por enquanto, os planos são os seguintes: Uma mostra sobre bricotecnologia: coisas feitas com as mãos, ou usando tecnologias abertas, ou que embutam processos abertos de desenvolvimento. Havia uma chamada por contribuições aberta até a semana passada (mas dá pra esticar um pouquinho mais, manda lá!) Um seminário de um dia (em 17 de maio) com paineis sobre tecnologias livres, apropriação crítica, translocalidade e outros temas. Sessões remotas no mesmo dia, com gente participando de diversas localidades no mundo (quer armar um grupo ou participar? me avise!). Workshops e grupos de trabalho mais espontâneos durante o Camp Pixelache que acontece em Naissaar. O Camp está aberto a propostas de participação, mande lá.O processo de planejamento e preparação para o programa Bricolabs do Pixelache tem sido muito rico. Além da oportunidade de reaproximar integrantes da Bricolabs, percebi em ambas as redes e aquilo que fazemos aqui no Brasil muitos assuntos em comum (uma olhada rápida no site deles mostra uma visita a uma recicladora de lixo, encontros para recuperar equipamentos, e por aí vai). Quem sabe começamos a pensar em um evento aqui em Ubatuba ligado à rede Pixelache para o futuro...
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Ciudades Creativas – parte 1

sex, 15/03/2013 - 22:49

Ano passado, fui gentilmente convidado pela Fundação Kreanta a participar da quinta edição das Jornadas Ciudades Creativas, no começo de outubro em Medellín, Colômbia. É um seminário nascido na Espanha que já há alguns anos debate a articulação da produção de conhecimento como instrumento de transformação urbana. Talvez reflexo da crise econômica europeia, eles atravessaram o Atlântico - e pelo que entendi pretendem permanecer do lado de cá.

Confesso que em um primeiro momento fiquei com o pé atrás justamente porque me incomodam tantos projetos de "economia criativa" que estimulam uma retórica excludente, submissa aos mecanismos do capital internacional, com todas as implicações negativas que criam. Mas depois de conversar um pouco com pessoas na Colômbia envolvidas com o seminário, e de dar uma olhada no que tinha acontecido nas edições anteriores (2009, 2010, 2011), entendi que eles têm uma preocupação genuína em aprofundar as questões e encontrar maneiras de equilibrar o desenvolvimento das práticas que adotam esses discursos.

Eu viajaria a Medellín em uma terça-feira. Na manhã anterior, estava arrumando minha mala em Campinas quando vi um email do Felipe Cabral na lista da MetaReciclagem, convidando quem quisesse a participar de um encontro com a nova Ministra da Cultura Marta Suplicy, no Coletivo Digital. Apressei o passo para chegar a tempo. A reunião parecia uma daquelas cenas de filme medieval: a audiência com a rainha. Alternadamente, representantes de diversos projetos e movimentos eram instados a externar suas demandas. Pedi o microfone e comentei sobre o edital de bolsas de cultura digital experimental que eu e Maira desenvolvemos durante a investigação Rede//Labs em 2010. Na época, chegamos a redigir a minuta do edital e deixá-lo pronto para sair, mas a gestão Ana de Hollanda engavetou tudo. A nova ministra falou que ia investigar, encaminhou a questão para uma assessora (e até hoje não ouvi mais falar disso, mas tenhamos paciência porque o ritmo da burocracia é esse mesmo). O encontro também foi positivo para rever um monte de gente boa. O ponto alto foi quando TC, da Casa de Cultura Tainã, presenteou a ministra com um baobá. Saí da reunião e ainda consegui uma sessão de acupuntura, para regular os parafusos que tinham desestabilizado nos Estados Unidos.

Acordei às cinco da manhã na terça-feira para pegar o ônibus de Congonhas até Guarulhos antes do trânsito começar. São Paulo nesse horário é uma outra cidade. Parecia até civilizada. Pessoas conversando nas banquinhas de comida. Uma ave de rapina (carcará, gaviãozinho?) na beira da 23 de maio. E nenhum trânsito. O trajeto CGH-GRU passou em quarenta minutos. Podia ser sempre assim. Como faz falta esse trem…

Eu já havia feito o check-in pela internet. Desci do ônibus e peguei a fila da Avianca no guichê do lado de fora. Só depois de alguns minutos me disseram que para voo internacional deveria fazer lá dentro. Sem crise, entreguei a bagagem e entrei. Só lá dentro percebi que tinha esquecido de pegar dinheiro. Não tinha certeza se conseguiria sacar direto de caixas automáticos na Colômbia. Decidi sair pela alfândega, pegar alguns reais e entrar de novo. Não funciono bem de manhã cedo.

O avião (A330) era novo e bem espaçoso. Tinha sisteminha de vídeo pessoal e uma porta USB para carregar dispositivos móveis. O voo da Avianca foi bem tranquilo. Tivemos um café da manhã razoável. Ao fim do voo de seis horas, um lanche fraquinho com sanduíche. Ao meu lado, voava uma argentina que saia de seu país pela primeira vez para um encontro da igreja. Não conversamos muito, e nem senti falta. Diversões eletrônicas ocupando a mente.

Desci em Bogotá. O rapaz da alfândega não era simpático, mas a carta de convite resolveu a entrada. Tomei o ônibus interno até o terminal doméstico. Tentei sacar pesos em todos os caixas eletrônicos do aeroporto, sem sucesso. Ainda bem que havia sacado aqueles trocados no Brasil. Dei uma volta por ali e acabei entrando para a sala de embarque, acreditando que haveria alguma coisa decente para almoçar. Nada. Gastei mais dinheiro do que gostaria para comer uma tortilla e um quibe. Eu havia acabado de adquirir meu computador, e ainda não tinha resolvido uns bugs do wifi. Não consegui me conectar a nenhuma rede no aeroporto.

O voo de Bogotá a Medellín é muito rápido, nem dá tempo para servirem comida. Mas o visual é lindo: montanhas arredondadas, esverdeadas. Quase chegando, zonas de mata e pequenos ranchos rurais dão a paisagem.

Desci do avião. O aeroporto é novinho. Um motorista me aguardava. Nos quarenta minutos saindo do cenário rural de montanha em direção à cidade incrustada no meio de um vale, pude ter uma primeira impressão sobre o efeito simbólico da transformação efetiva que aconteceu em Medellín. Lê-se muito sobre as mudanças na cidade, e eu não costumo acreditar muito no que leio. O motorista demonstrava um amor pela cidade, ou nem tanto pela cidade quanto pelo que tem mudado na cidade nessas últimas décadas, que me deixou curioso. Nos dias seguintes eu teria outros sinais dessa transformação.

O hotel era metido: já de cara, o jantar “leve” tinha até creme de aspargos. Ficava em um bairro cheio de ladeiras, hoteis para estrangeiros, prédios altos e centros de compras. Nada para mim ali, teria que procurar a vida da cidade em outros lugares. E isso fica para as próximas partes deste texto.

Ano passado, fui gentilmente convidado pela Fundação Kreanta a participar da quinta edição das Jornadas Ciudades Creativas, no começo de outubro em Medellín, Colômbia. É um seminário nascido na Espanha que já há alguns anos debate a articulação da produção de conhecimento como instrumento de transformação urbana. Talvez reflexo da crise econômica europeia, eles atravessaram o Atlântico - e pelo que entendi pretendem permanecer do lado de cá.Confesso que em um primeiro momento fiquei com o pé atrás justamente porque me incomodam tantos projetos de "economia criativa" que estimulam uma retórica excludente, submissa aos mecanismos do capital internacional, com todas as implicações negativas que criam. Mas depois de conversar um pouco com pessoas na Colômbia envolvidas com o seminário, e de dar uma olhada no que tinha acontecido nas edições anteriores (2009, 2010, 2011), entendi que eles têm uma preocupação genuína em aprofundar as questões e encontrar maneiras de equilibrar o desenvolvimento das práticas que adotam esses discursos.Eu viajaria a Medellín em uma terça-feira. Na manhã anterior, estava arrumando minha mala em Campinas quando vi um email do Felipe Cabral na lista da MetaReciclagem, convidando quem quisesse a participar de um encontro com a nova Ministra da Cultura Marta Suplicy, no Coletivo Digital. Apressei o passo para chegar a tempo. A reunião parecia uma daquelas cenas de filme medieval: a audiência com a rainha. Alternadamente, representantes de diversos projetos e movimentos eram instados a externar suas demandas. Pedi o microfone e comentei sobre o edital de bolsas de cultura digital experimental que eu e Maira desenvolvemos durante a investigação Rede//Labs em 2010. Na época, chegamos a redigir a minuta do edital e deixá-lo pronto para sair, mas a gestão Ana de Hollanda engavetou tudo. A nova ministra falou que ia investigar, encaminhou a questão para uma assessora (e até hoje não ouvi mais falar disso, mas tenhamos paciência porque o ritmo da burocracia é esse mesmo). O encontro também foi positivo para rever um monte de gente boa. O ponto alto foi quando TC, da Casa de Cultura Tainã, presenteou a ministra com um baobá. Saí da reunião e ainda consegui uma sessão de acupuntura, para regular os parafusos que tinham desestabilizado nos Estados Unidos.Acordei às cinco da manhã na terça-feira para pegar o ônibus de Congonhas até Guarulhos antes do trânsito começar. São Paulo nesse horário é uma outra cidade. Parecia até civilizada. Pessoas conversando nas banquinhas de comida. Uma ave de rapina (carcará, gaviãozinho?) na beira da 23 de maio. E nenhum trânsito. O trajeto CGH-GRU passou em quarenta minutos. Podia ser sempre assim. Como faz falta esse trem…Eu já havia feito o check-in pela internet. Desci do ônibus e peguei a fila da Avianca no guichê do lado de fora. Só depois de alguns minutos me disseram que para voo internacional deveria fazer lá dentro. Sem crise, entreguei a bagagem e entrei. Só lá dentro percebi que tinha esquecido de pegar dinheiro. Não tinha certeza se conseguiria sacar direto de caixas automáticos na Colômbia. Decidi sair pela alfândega, pegar alguns reais e entrar de novo. Não funciono bem de manhã cedo.O avião (A330) era novo e bem espaçoso. Tinha sisteminha de vídeo pessoal e uma porta USB para carregar dispositivos móveis. O voo da Avianca foi bem tranquilo. Tivemos um café da manhã razoável. Ao fim do voo de seis horas, um lanche fraquinho com sanduíche. Ao meu lado, voava uma argentina que saia de seu país pela primeira vez para um encontro da igreja. Não conversamos muito, e nem senti falta. Diversões eletrônicas ocupando a mente.Desci em Bogotá. O rapaz da alfândega não era simpático, mas a carta de convite resolveu a entrada. Tomei o ônibus interno até o terminal doméstico. Tentei sacar pesos em todos os caixas eletrônicos do aeroporto, sem sucesso. Ainda bem que havia sacado aqueles trocados no Brasil. Dei uma volta por ali e acabei entrando para a sala de embarque, acreditando que haveria alguma coisa decente para almoçar. Nada. Gastei mais dinheiro do que gostaria para comer uma tortilla e um quibe. Eu havia acabado de adquirir meu computador, e ainda não tinha resolvido uns bugs do wifi. Não consegui me conectar a nenhuma rede no aeroporto.O voo de Bogotá a Medellín é muito rápido, nem dá tempo para servirem comida. Mas o visual é lindo: montanhas arredondadas, esverdeadas. Quase chegando, zonas de mata e pequenos ranchos rurais dão a paisagem.Desci do avião. O aeroporto é novinho. Um motorista me aguardava. Nos quarenta minutos saindo do cenário rural de montanha em direção à cidade incrustada no meio de um vale, pude ter uma primeira impressão sobre o efeito simbólico da transformação efetiva que aconteceu em Medellín. Lê-se muito sobre as mudanças na cidade, e eu não costumo acreditar muito no que leio. O motorista demonstrava um amor pela cidade, ou nem tanto pela cidade quanto pelo que tem mudado na cidade nessas últimas décadas, que me deixou curioso. Nos dias seguintes eu teria outros sinais dessa transformação.O hotel era metido: já de cara, o jantar “leve” tinha até creme de aspargos. Ficava em um bairro cheio de ladeiras, hoteis para estrangeiros, prédios altos e centros de compras. Nada para mim ali, teria que procurar a vida da cidade em outros lugares. E isso fica para as próximas partes deste texto.
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Sistema Municipal de Cultura - aprovado!

ter, 12/03/2013 - 22:38

Saí há pouco da Câmara Municipal de Ubatuba, cuja ordem do dia incluía o projeto de lei do Sistema Municipal de Cultura da cidade. A partir do fantástico esforço da comissão de cultura, enfrentando inclusive o projeto incorporou os diversos mecanismos democratizantes previstos na constituição: conselho, plano, conferência, etc. Nossa amiga Milena Franceschinelli inscreveu-se para falar sobre o projeto à mesa. O projeto foi aprovado em votação unânime na Câmara. Houve apenas pequenas correções de grafia e uma emenda para explicitar a prioridade às populações indígenas, cultura caiçara e grupos afrodescendentes ligados a quilombos. Diversos vereadores aproveitaram a discussão para elogiar Isabela Vassão, diretora da Fundart, e a comissão que trabalhou pela elaboração e apresentação do SMC.

Deixo aqui os parabéns para todo mundo envolvido: a comissão, a Fundart, Isabela e Milena. E que se preparem porque isso é só o começo, vem muito trabalho pela frente!

PS.: mais informações aqui na página do PT de Ubatuba.

Saí há pouco da Câmara Municipal de Ubatuba, cuja ordem do dia incluía o projeto de lei do Sistema Municipal de Cultura da cidade. A partir do fantástico esforço da comissão de cultura, enfrentando inclusive o projeto incorporou os diversos mecanismos democratizantes previstos na constituição: conselho, plano, conferência, etc. Nossa amiga Milena Franceschinelli inscreveu-se para falar sobre o projeto à mesa. O projeto foi aprovado em votação unânime na Câmara. Houve apenas pequenas correções de grafia e uma emenda para explicitar a prioridade às populações indígenas, cultura caiçara e grupos afrodescendentes ligados a quilombos. Diversos vereadores aproveitaram a discussão para elogiar Isabela Vassão, diretora da Fundart, e a comissão que trabalhou pela elaboração e apresentação do SMC.Deixo aqui os parabéns para todo mundo envolvido: a comissão, a Fundart, Isabela e Milena. E que se preparem porque isso é só o começo, vem muito trabalho pela frente!PS.: mais informações aqui na página do PT de Ubatuba.
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Conexão Finlândia

sex, 15/02/2013 - 12:04

Em visita ao Brasil por motivos pessoais, o finlandês Tapio Mäkelä passar uns dias em Ubatuba. Estamos conversando sobre possibilidades para o futuro, desde a programação bricolabs que estou agitando durante o festival Pixelache em Helsinki, neste próximo mês de maio, até os planos futuros de realizar um evento científico-artístico em Ubatuba no segundo semestre (nos moldes da Cigac-Semiárido que fizemos ano passado na Paraíba). Fomos à sede do projeto Tamar para entender melhor quais são as questões que eles enfrentam por aqui. Estamos também em conversas sobre parcerias possíveis para fazer coisas continuadas aqui em Ubatuba.

(e o gringo deu sorte: manhãs ensolaradas e tardes chuvosas)

Em visita ao Brasil por motivos pessoais, o finlandês Tapio Mäkelä passar uns dias em Ubatuba. Estamos conversando sobre possibilidades para o futuro, desde a programação bricolabs que estou agitando durante o festival Pixelache em Helsinki, neste próximo mês de maio, até os planos futuros de realizar um evento científico-artístico em Ubatuba no segundo semestre (nos moldes da Cigac-Semiárido que fizemos ano passado na Paraíba). Fomos à sede do projeto Tamar para entender melhor quais são as questões que eles enfrentam por aqui. Estamos também em conversas sobre parcerias possíveis para fazer coisas continuadas aqui em Ubatuba.(e o gringo deu sorte: manhãs ensolaradas e tardes chuvosas)
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Diário do ventre da besta - parte 3

seg, 04/02/2013 - 13:22
Última parte do meu relato sobre a participação no ISEA, em Albuquerque, setembro do ano passado. Veja também a parte 1 e a parte 2.

 

No café da manhã de sábado, todos os americanos tinham os olhos grudados na imensa TV do salão. Cobertura da campanha presidencial - Romney tinha falado alguma besteira. Encontrei parte da turma brasileira, e logo Teresa nos deu uma carona até o Centro Nacional de Cultura Hispânica (NHCC), que sediaria o Fórum Latinoamericano do ISEA.

É forte essa coisa da identidade "hispânica" naquelas paragens - me pergunto se os estadunidenses chegam a atinar a relação etimológica com "Espanha" ou se já significa uma coisa totalmente diferente. Penso também no pesado legado da política do multiculturalismo, que acaba induzindo as pessoas a se identificarem com alguma "minoria". Engraçado ver em Albuquerque aqueles carrões antigos, conversíveis, guiados por "hispânicos" tatuados, totalmente enquadrados no estereótipo cultural.

O Centro de Cultura Hispânica é grande, bonito, bem estruturado. Salas, auditórios, um pátio amplo com palco debaixo de uma larga árvore que alivia um pouco o calor. Tem uma grande placa do Instituto Cervantes, que infelizmente me fez lembrar dos tropeços do CCE de São Paulo, desaparecido graças às inversões políticas de Madrid. Logo na recepção, Fred Paulino conta que Ganso havia enfartado e estava no hospital. Justo nos EUA, que têm péssima fama na saúde.

Chegamos à sala que sediaria o painel sobre mapeamentos, balões e pipas. Demoramos um pouco para começar, já que haviam armado a tela do projetor justamente na parede onde o sol batia, e não havia jeito de fechar a janela. Lucas Bambozzi, Rodrigo Minelli, eu e Bruno Vianna contamos sobre diferentes projetos no Brasil sobre mapeamento colaborativo e afins. Eu falei sobre "mapeamento experimental".

Depois, circulei um pouco entre os paineis. Assisti a um pedaço da excelente apresentação de Coco Fusco. Eu seria o moderador do painel sobre labs abertos, o primeiro da tarde. Havia mandado alguns dias antes um email para todos os participantes do painel, sugerindo que almoçássemos para alinhar o formato do painel. Dois deles (talvez sem coincidência, os dois mais bem posicionados em instituições estáveis) nem responderam. Almocei com os outros - Gabriel Zea / Camilo Martinez  e Leslie Garcia - nas barraquinhas de comida no quintal do NHCC. Encontramos os outros no algo intimidante auditório principal, cinco minutos antes de começar o painel.

Não gostei do resultado do painel sobre labs. Minha falta de intimidade com os outros dois participantes - um dos quais fez sua fala em espanhol - dificultou um pouco. Fui também flexível demais com o tempo de fala de cada um, deixei todo mundo estourar. E começamos uns 15 minutos atrasados enquanto esperávamos a sala encher depois do almoço - dada a falta de comentários sobre o atraso da nossa primeira sessão pela manhã, não achei que seria um problema -, mas fomos cobrados pontualmente a liberar a sala. Resultado: nenhum debate, quatro falas isoladas, e tensão na saída.

Passei mais algum tempo assistindo a algumas apresentações. Vi o artist talk do Bruno Vianna. Lucas e outros faziam a oficina de balões. Vi pedaços da apresentação do Bill Toledo - um dos remanescentes native code talkers, índios que serviram ao exército estadunidense durante a segunda guerra usando seus próprios códigos para transmitir mensagens cifradas.

Cheguei a combinar com alguns conhecidos de nos encontrarmos mais tarde na microcervejaria Marble, e tomei o ônibus de volta para o hotel. Estava um pouco chateado pelo resultado do painel sobre labs. Talvez também estivesse um pouco abalado por uma soma de coisas. Ainda navegava pelo mal-estar do jet lag. Havia sido temerário nas saídas a pé por uma cidade seca, alta e de sol forte. Além dos cansaços, também me mexeram outros fatores .Me sentia um peixe fora d'água naquela cidade, naquele país e naquele evento. Era a primeira vez que ficava tão longe da minha filha - se precisasse voltar para casa, levaria no mínimo dois dias para chegar. Mais do que tudo, entretanto, acho que me desequilibrou a notícia do enfarte do Ganso, que desenterrou alguns fantasmas do passado que haviam ficado quietos por um par de anos. No começo de dezembro de 2009, eu presenciei o falecimento de um vizinho, já idoso, cujo coração falhou. Alguns dias depois, tive um episódio de ansiedade, e em mais algumas semanas perdi um grande amigo sem ter a oportunidade de dizer adeus. Isso tudo acabou se misturando naquele momento, e minha noite de sábado foi bastante difícil.

Tentei descansar um pouco e não consegui. Acabei saindo a pé até a Marble, bastante tenso, algo ansioso. Tentando sem sucesso encontrar o meu pato na cara a duzentos e cinquenta nós. A cidade também é deserta à noite. Cheguei na Marble muito depois da hora que tinha sugerido ao pessoal. Não encontrei ninguém, fiquei um tempinho por ali ouvindo a banda country e voltei ao hotel. Demorei um tempão para finalmente dormir.

No domingo, estava um pouco melhor. Passei pela biblioteca pública de Albuquerque, onde rolava o painel sobre inclusão digital. Sou suspeito para falar, mas nossos debates sobre isso aqui no Brasil estão muito à frente do que eles conseguem conceber. Só falam em acesso doméstico, empreendedorismo formal, metáfora de rede para falar sobre a sociedade. Não conseguem imaginar novas realidades culturais ligadas às tecnologias de informação. No máximo pensam em tecnologias como compensação, para oferecer oportunidades do cara "virar um cientista" ou "encontrar um emprego". Era mais uma manifestação do multiculturalismo: um dos participantes estava preocupado com o menor acesso de negros à pós-graduação (um debate importantíssimo na minha opinião, mas não tão relevante em um debate sobre inclusão digital). Perdi a paciência bem rápido, se pegasse o microfone ia passar tempo demais desconstruindo. Pulei entre diferentes paineis, não achei nada que me prendesse. Almocei um gigantesco hambúrguer com chá gelado (que vem sem açúcar) em uma lanchonete chamada Q Burger, que tinha quatro grandes TVs transmitindo simultaneamente (e com o som ligado) dois jogos diferentes de futebol americano.

Ao longo da tarde, estava rolando a Downtown Block Party, uma programação meio aberta em dois quarteirões da avenida principal no centro. Estavam por lá alguns "artistas de carros", alguns palcos, uma instalação com instrumentos musicais, alguns estandes de gente falando sobre bancos de sementes, uma escola que organiza cursos e oficinas gambiarrentos, algumas galerias com mostras ligadas ao ISEA, e outras coisas. Um monte de gente se acotovelava para assistir a uma apresentação de low riders, com um monte de carros tunados guiados por hispanos. Tudo muito curioso, mas chamar de "party" pareceu exagero.

Na verdade, ainda à beira da ansiedade, acabei sabotando algumas boas oportunidades naquele domingo. Não me empolguei o suficiente para pagar o ingresso da Mini Maker Faire, nem da apresentação de Laurie Anderson. Não tive disposição para o show dos Dead Kennedys (ok, sem o Jello mas ainda assim certamente divertido). Capotei no hotel.

No dia seguinte, saí atrás de presentes para a pequena (experiência radical: fazer compras em meio às entranhas da besta, e de repente perceber que o shopping center não tem táxis). À tarde, dei mais uma volta e comecei a empacotar as coisas para ir embora no dia seguinte. Ainda recebi mais um convite: me perguntaram se eu não queria ir de carro até Santa Fe para retornar no dia seguinte. Deveria ter aceito, mas não pude. No dia seguinte, embarquei de volta para o Brasil.

Aqueles poucos dias em território estadunidense mexeram bastante comigo. Na próxima vez, vou tratar de devidamente preparar o espírito antes de embarcar. Marcaram também o momento em que decidi que o referencial de colaboração transdisciplinar formal entre arte e ciência tão presente na arte eletrônica definitivamente não funciona como base concreta para o tipo de laboratórios que venho tentado estudar e implementar. Ali existe um aspecto muito presente de apropriação de impulsos desviantes para oxigenar e reafirmar estruturas de poder: muito barulho, muita pose e pouca mudança efetiva. Foi importante perceber isso em um contexto supostamente alternativo no meio dos Estados Unidos: eu já sabia disso tudo, mas lá ficou muito claro que não existe muita saída por aquelas trilhas.

Veja também: mais fotos que fiz durante o ISEA.

PS.: Ganso teve alta, foi muito bem atendido e não precisou pagar nada - os custos foram assumidos pela rede de saúde do estado do Novo México. Aparentemente, aquele está longe de ser o pior lugar dos EUA.

Última parte do meu relato sobre a participação no ISEA, em Albuquerque, setembro do ano passado. Veja também a parte 1 e a parte 2.  No café da manhã de sábado, todos os americanos tinham os olhos grudados na imensa TV do salão. Cobertura da campanha presidencial - Romney tinha falado alguma besteira. Encontrei parte da turma brasileira, e logo Teresa nos deu uma carona até o Centro Nacional de Cultura Hispânica (NHCC), que sediaria o Fórum Latinoamericano do ISEA.É forte essa coisa da identidade "hispânica" naquelas paragens - me pergunto se os estadunidenses chegam a atinar a relação etimológica com "Espanha" ou se já significa uma coisa totalmente diferente. Penso também no pesado legado da política do multiculturalismo, que acaba induzindo as pessoas a se identificarem com alguma "minoria". Engraçado ver em Albuquerque aqueles carrões antigos, conversíveis, guiados por "hispânicos" tatuados, totalmente enquadrados no estereótipo cultural.O Centro de Cultura Hispânica é grande, bonito, bem estruturado. Salas, auditórios, um pátio amplo com palco debaixo de uma larga árvore que alivia um pouco o calor. Tem uma grande placa do Instituto Cervantes, que infelizmente me fez lembrar dos tropeços do CCE de São Paulo, desaparecido graças às inversões políticas de Madrid. Logo na recepção, Fred Paulino conta que Ganso havia enfartado e estava no hospital. Justo nos EUA, que têm péssima fama na saúde.Chegamos à sala que sediaria o painel sobre mapeamentos, balões e pipas. Demoramos um pouco para começar, já que haviam armado a tela do projetor justamente na parede onde o sol batia, e não havia jeito de fechar a janela. Lucas Bambozzi, Rodrigo Minelli, eu e Bruno Vianna contamos sobre diferentes projetos no Brasil sobre mapeamento colaborativo e afins. Eu falei sobre "mapeamento experimental".Depois, circulei um pouco entre os paineis. Assisti a um pedaço da excelente apresentação de Coco Fusco. Eu seria o moderador do painel sobre labs abertos, o primeiro da tarde. Havia mandado alguns dias antes um email para todos os participantes do painel, sugerindo que almoçássemos para alinhar o formato do painel. Dois deles (talvez sem coincidência, os dois mais bem posicionados em instituições estáveis) nem responderam. Almocei com os outros - Gabriel Zea / Camilo Martinez  e Leslie Garcia - nas barraquinhas de comida no quintal do NHCC. Encontramos os outros no algo intimidante auditório principal, cinco minutos antes de começar o painel.Não gostei do resultado do painel sobre labs. Minha falta de intimidade com os outros dois participantes - um dos quais fez sua fala em espanhol - dificultou um pouco. Fui também flexível demais com o tempo de fala de cada um, deixei todo mundo estourar. E começamos uns 15 minutos atrasados enquanto esperávamos a sala encher depois do almoço - dada a falta de comentários sobre o atraso da nossa primeira sessão pela manhã, não achei que seria um problema -, mas fomos cobrados pontualmente a liberar a sala. Resultado: nenhum debate, quatro falas isoladas, e tensão na saída.Passei mais algum tempo assistindo a algumas apresentações. Vi o artist talk do Bruno Vianna. Lucas e outros faziam a oficina de balões. Vi pedaços da apresentação do Bill Toledo - um dos remanescentes native code talkers, índios que serviram ao exército estadunidense durante a segunda guerra usando seus próprios códigos para transmitir mensagens cifradas.Cheguei a combinar com alguns conhecidos de nos encontrarmos mais tarde na microcervejaria Marble, e tomei o ônibus de volta para o hotel. Estava um pouco chateado pelo resultado do painel sobre labs. Talvez também estivesse um pouco abalado por uma soma de coisas. Ainda navegava pelo mal-estar do jet lag. Havia sido temerário nas saídas a pé por uma cidade seca, alta e de sol forte. Além dos cansaços, também me mexeram outros fatores .Me sentia um peixe fora d'água naquela cidade, naquele país e naquele evento. Era a primeira vez que ficava tão longe da minha filha - se precisasse voltar para casa, levaria no mínimo dois dias para chegar. Mais do que tudo, entretanto, acho que me desequilibrou a notícia do enfarte do Ganso, que desenterrou alguns fantasmas do passado que haviam ficado quietos por um par de anos. No começo de dezembro de 2009, eu presenciei o falecimento de um vizinho, já idoso, cujo coração falhou. Alguns dias depois, tive um episódio de ansiedade, e em mais algumas semanas perdi um grande amigo sem ter a oportunidade de dizer adeus. Isso tudo acabou se misturando naquele momento, e minha noite de sábado foi bastante difícil.Tentei descansar um pouco e não consegui. Acabei saindo a pé até a Marble, bastante tenso, algo ansioso. Tentando sem sucesso encontrar o meu pato na cara a duzentos e cinquenta nós. A cidade também é deserta à noite. Cheguei na Marble muito depois da hora que tinha sugerido ao pessoal. Não encontrei ninguém, fiquei um tempinho por ali ouvindo a banda country e voltei ao hotel. Demorei um tempão para finalmente dormir.No domingo, estava um pouco melhor. Passei pela biblioteca pública de Albuquerque, onde rolava o painel sobre inclusão digital. Sou suspeito para falar, mas nossos debates sobre isso aqui no Brasil estão muito à frente do que eles conseguem conceber. Só falam em acesso doméstico, empreendedorismo formal, metáfora de rede para falar sobre a sociedade. Não conseguem imaginar novas realidades culturais ligadas às tecnologias de informação. No máximo pensam em tecnologias como compensação, para oferecer oportunidades do cara "virar um cientista" ou "encontrar um emprego". Era mais uma manifestação do multiculturalismo: um dos participantes estava preocupado com o menor acesso de negros à pós-graduação (um debate importantíssimo na minha opinião, mas não tão relevante em um debate sobre inclusão digital). Perdi a paciência bem rápido, se pegasse o microfone ia passar tempo demais desconstruindo. Pulei entre diferentes paineis, não achei nada que me prendesse. Almocei um gigantesco hambúrguer com chá gelado (que vem sem açúcar) em uma lanchonete chamada Q Burger, que tinha quatro grandes TVs transmitindo simultaneamente (e com o som ligado) dois jogos diferentes de futebol americano.Ao longo da tarde, estava rolando a Downtown Block Party, uma programação meio aberta em dois quarteirões da avenida principal no centro. Estavam por lá alguns "artistas de carros", alguns palcos, uma instalação com instrumentos musicais, alguns estandes de gente falando sobre bancos de sementes, uma escola que organiza cursos e oficinas gambiarrentos, algumas galerias com mostras ligadas ao ISEA, e outras coisas. Um monte de gente se acotovelava para assistir a uma apresentação de low riders, com um monte de carros tunados guiados por hispanos. Tudo muito curioso, mas chamar de "party" pareceu exagero.Na verdade, ainda à beira da ansiedade, acabei sabotando algumas boas oportunidades naquele domingo. Não me empolguei o suficiente para pagar o ingresso da Mini Maker Faire, nem da apresentação de Laurie Anderson. Não tive disposição para o show dos Dead Kennedys (ok, sem o Jello mas ainda assim certamente divertido). Capotei no hotel.No dia seguinte, saí atrás de presentes para a pequena (experiência radical: fazer compras em meio às entranhas da besta, e de repente perceber que o shopping center não tem táxis). À tarde, dei mais uma volta e comecei a empacotar as coisas para ir embora no dia seguinte. Ainda recebi mais um convite: me perguntaram se eu não queria ir de carro até Santa Fe para retornar no dia seguinte. Deveria ter aceito, mas não pude. No dia seguinte, embarquei de volta para o Brasil.Aqueles poucos dias em território estadunidense mexeram bastante comigo. Na próxima vez, vou tratar de devidamente preparar o espírito antes de embarcar. Marcaram também o momento em que decidi que o referencial de colaboração transdisciplinar formal entre arte e ciência tão presente na arte eletrônica definitivamente não funciona como base concreta para o tipo de laboratórios que venho tentado estudar e implementar. Ali existe um aspecto muito presente de apropriação de impulsos desviantes para oxigenar e reafirmar estruturas de poder: muito barulho, muita pose e pouca mudança efetiva. Foi importante perceber isso em um contexto supostamente alternativo no meio dos Estados Unidos: eu já sabia disso tudo, mas lá ficou muito claro que não existe muita saída por aquelas trilhas.Veja também: mais fotos que fiz durante o ISEA.PS.: Ganso teve alta, foi muito bem atendido e não precisou pagar nada - os custos foram assumidos pela rede de saúde do estado do Novo México. Aparentemente, aquele está longe de ser o pior lugar dos EUA.
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Cidades digitais...

dom, 03/02/2013 - 18:04

Insistindo na abertura do conceito de cidades digitais - de maneira que abarque não somente o aumento de eficiência da máquina pública e o alívio pontual de disparidades, mas insira também a escala local e suas demandas na própria autoria do imaginário tecnológico e de suas invenções - tenho presenciado alguns movimentos interessantes. Estou conversando com a nova gestão da Prefeitura de Ubatuba, em busca de um modelo que faça sentido para as características únicas da cidade. Estou também tratando de projetos similares em outras cidades da região. As ideias têm ressoado. A ver o quanto vamos conseguir pôr em prática.

Também fui chamado, como já comentei aqui, a participar de um debate no Transmediale sobre o assunto na quinta-feira passada, junto com pessoas que estudam ou estiveram envolvidas com projetos europeus de "cidades digitais" nos anos noventa. Para encerrar a semana, fiz um bate-volta para São Paulo na sexta, a convite do W3C/CGI e Prefeitura de São Paulo, onde falei junto com James Wallbank sobre "Cidades Digitais e Open Labs". As condições do trânsito aumentaram o tempo da minha viagem, o que acabou proporcionando um novo texto sobre cidades digitais, que devo publicar aqui assim que tiver tempo de digitá-lo. Nenhuma novidade para quem já leu meus outros textos, somente mais uma coleção de argumentos sobre como os labs abertos podem ser uma saída para algumas das arapucas da cidade contemporânea. No mais, foi bom conhecer mais pessoas do W3C, além de reencontrar James e dar uma volta rápida pelo Anhangabaú.

Insistindo na abertura do conceito de cidades digitais - de maneira que abarque não somente o aumento de eficiência da máquina pública e o alívio pontual de disparidades, mas insira também a escala local e suas demandas na própria autoria do imaginário tecnológico e de suas invenções - tenho presenciado alguns movimentos interessantes. Estou conversando com a nova gestão da Prefeitura de Ubatuba, em busca de um modelo que faça sentido para as características únicas da cidade. Estou também tratando de projetos similares em outras cidades da região. As ideias têm ressoado. A ver o quanto vamos conseguir pôr em prática.Também fui chamado, como já comentei aqui, a participar de um debate no Transmediale sobre o assunto na quinta-feira passada, junto com pessoas que estudam ou estiveram envolvidas com projetos europeus de "cidades digitais" nos anos noventa. Para encerrar a semana, fiz um bate-volta para São Paulo na sexta, a convite do W3C/CGI e Prefeitura de São Paulo, onde falei junto com James Wallbank sobre "Cidades Digitais e Open Labs". As condições do trânsito aumentaram o tempo da minha viagem, o que acabou proporcionando um novo texto sobre cidades digitais, que devo publicar aqui assim que tiver tempo de digitá-lo. Nenhuma novidade para quem já leu meus outros textos, somente mais uma coleção de argumentos sobre como os labs abertos podem ser uma saída para algumas das arapucas da cidade contemporânea. No mais, foi bom conhecer mais pessoas do W3C, além de reencontrar James e dar uma volta rápida pelo Anhangabaú.
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Remixando as cidades digitais

ter, 29/01/2013 - 14:57

Amanhã participo pela internet, do painel "Remixing Digital Cities", parte da programação da Transmediale que acontece essa semana em Berlim. Quase fui para lá passar frio (a internet me conta que neste exato momento fazem cinco graus em Berlim), mas eles só conseguiram confirmar o convite oficial em cima da hora, quando já não dava mais para reprogramar minha vida.

Estou agora mesmo planejando minha participação - pretendo explorar assuntos nos quais já toquei em outros textos aqui, talvez esbarrando também em questões de poder e centralização que são características nas cidades brasileiras.

O painel acontece amanhã, quarta-feira, quinta-feira 31/01 às 12hs do horário brasileiro. Deve ser transmitido pelo site do festival.

Atualizando: eu havia me enganado, confundi o 30 com 31. O painel acontece amanhã, quinta, dia 31 de janeiro!

Amanhã participo pela internet, do painel "Remixing Digital Cities", parte da programação da Transmediale que acontece essa semana em Berlim. Quase fui para lá passar frio (a internet me conta que neste exato momento fazem cinco graus em Berlim), mas eles só conseguiram confirmar o convite oficial em cima da hora, quando já não dava mais para reprogramar minha vida.Estou agora mesmo planejando minha participação - pretendo explorar assuntos nos quais já toquei em outros textos aqui, talvez esbarrando também em questões de poder e centralização que são características nas cidades brasileiras.O painel acontece amanhã, quarta-feira, quinta-feira 31/01 às 12hs do horário brasileiro. Deve ser transmitido pelo site do festival.Atualizando: eu havia me enganado, confundi o 30 com 31. O painel acontece amanhã, quinta, dia 31 de janeiro!
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Outros futuros

qui, 17/01/2013 - 23:51

Última página do Futuros Imaginários de Richard Barbrook. Buscando superar os futuros imaginários forjados durante a Guerra Fria do fim do milênio passado...

Desde meados dos anos 1990, as possibilidades culturais e políticas abertas pela Internet se tornaram simbolizadas por novos ícones: ciborgues socialistas-feministas, hackers anarco-comunistas e artesões digitais social-democratas. Durante as últimas quatro décadas, suas atitudes “façam-vocês-mesmos” transformaram com sucesso as máquinas de fazer guerra e dinheiro em ferramentas de sociabilidade e expressão pessoal. No início do século XXI, os usuários da Internet são agora tanto consumidores quanto produtores de mídia. A vanguarda perdeu seu monopólio ideológico. O espetáculo foi quebrado. Dentro da Internet, o comunismo cibernético existe aqui e agora. Entretanto, ao mesmo tempo, a chegada da sociedade da informação não precipitou uma transformação social mais extensa.
O pós-fordismo é quase indistinguível do fordismo. O comunismo cibernético é bem compatível com o capitalismo ponto com. Ao contrário do que diziam as doutrinas do mcluhanismo, a convergência das mídias, das telecomunicações e da computação não libertou – e nunca libertará – a humanidade. A Internet é uma ferramenta útil, não uma tecnologia redentora. Na teoria sem fetiche, são os humanos os heróis da grande narrativa da história. No final da década de 2000, pessoas comuns tomaram o controle de sofisticadas tecnologias da informação para melhorar suas vidas cotidianas e suas condições sociais. Liberada dos futuros pré-determinados do mcluhanismo, essa conquista emancipatória pode fornecer inspiração para novas antecipações da forma das coisas que virão. Criatividade cooperativa e democracia participativa devem ser estendidas do mundo virtual para todas as áreas da vida. Dessa vez, o novo estágio de crescimento deve ser uma nova civilização. Mais do que disciplinar o presente, essas novas visões futuristas podem ser abertas e flexíveis. Nós somos os inventores de nossas próprias tecnologias. Nós podemos controlar nossas próprias máquinas. Nós somos os criadores das formas das coisas que virão. Nós podemos intervir na história para realizar nossos próprios interesses. Nossas utopias fornecem a direção para o caminho do progresso humano. Sejamos esperançosos e corajosos ao imaginarmos os melhores futuros da social-democracia libertária.

Última página do Futuros Imaginários de Richard Barbrook. Buscando superar os futuros imaginários forjados durante a Guerra Fria do fim do milênio passado... Desde meados dos anos 1990, as possibilidades culturais e políticas abertas pela Internet se tornaram simbolizadas por novos ícones: ciborgues socialistas-feministas, hackers anarco-comunistas e artesões digitais social-democratas. Durante as últimas quatro décadas, suas atitudes “façam-vocês-mesmos” transformaram com sucesso as máquinas de fazer guerra e dinheiro em ferramentas de sociabilidade e expressão pessoal. No início do século XXI, os usuários da Internet são agora tanto consumidores quanto produtores de mídia. A vanguarda perdeu seu monopólio ideológico. O espetáculo foi quebrado. Dentro da Internet, o comunismo cibernético existe aqui e agora. Entretanto, ao mesmo tempo, a chegada da sociedade da informação não precipitou uma transformação social mais extensa. O pós-fordismo é quase indistinguível do fordismo. O comunismo cibernético é bem compatível com o capitalismo ponto com. Ao contrário do que diziam as doutrinas do mcluhanismo, a convergência das mídias, das telecomunicações e da computação não libertou – e nunca libertará – a humanidade. A Internet é uma ferramenta útil, não uma tecnologia redentora. Na teoria sem fetiche, são os humanos os heróis da grande narrativa da história. No final da década de 2000, pessoas comuns tomaram o controle de sofisticadas tecnologias da informação para melhorar suas vidas cotidianas e suas condições sociais. Liberada dos futuros pré-determinados do mcluhanismo, essa conquista emancipatória pode fornecer inspiração para novas antecipações da forma das coisas que virão. Criatividade cooperativa e democracia participativa devem ser estendidas do mundo virtual para todas as áreas da vida. Dessa vez, o novo estágio de crescimento deve ser uma nova civilização. Mais do que disciplinar o presente, essas novas visões futuristas podem ser abertas e flexíveis. Nós somos os inventores de nossas próprias tecnologias. Nós podemos controlar nossas próprias máquinas. Nós somos os criadores das formas das coisas que virão. Nós podemos intervir na história para realizar nossos próprios interesses. Nossas utopias fornecem a direção para o caminho do progresso humano. Sejamos esperançosos e corajosos ao imaginarmos os melhores futuros da social-democracia libertária.
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Diário do ventre da besta - parte 2

qua, 16/01/2013 - 22:22

Segunda parte do relato sobre minha participação no ISEA, em setembro de 2012. Por enquanto vai sem os links mesmo. Assim que conseguir eu publico a terceira e última.

Veja também: parte 1 e parte 3.

Em algum ponto do relativamente curto trajeto entre Atlanta e Albuquerque, comecei a prestar atenção à paisagem pela janela do avião. O horizonte se elevava aos poucos, passando por bonitas rochas recortadas e continuando a subir. O verde dava lugar àquela cor avermelhada dos desertos do oeste estadunidense. Sobrevoando aquela amplidão seca, fiquei pensando sobre as dificuldades de fazer funcionar uma cidade contemporânea ali. A aridez só era cortada por ilhas verdes, provavelmente instalações agrícolas intensivas. Alguns açudes, cercados do que parecia ser areia. Imaginei o transporte de combustível pelo meio do deserto. O consumo, a logística. A guerra para sustentar esses fluxos.

O aeroporto de Albuquerque (chamado Sunport, "porto do sol") poderia estar em alguma cidade turística litorânea. Cores fortes, uma luz quente vinda de fora. A influência mexicana é bem caracterizada, ao ponto da artificialidade - mais reconstrução do que herança. Encontrei um telefone público (que realmente tinha uma lista telefônica pendurada) e usei um quarto de dólar para ligar ao hotel requisitando o serviço de traslado. Em alguns minutos chegou uma van para me buscar. Espaçosa e silenciosa, como o próprio deserto havia parecido lá de cima. Lembrei de Jim Morrison fritando ao sol, viajando nos silêncios.

A cidade é iluminada, sob um céu de azul intenso. Seria um período curto em Albuquerque - pouco mais do que os três dias que passei em Lisboa em 2006. Sabia que não conseguiria conhecer muito da cidade, mas queria pelo menos ter alguma impressão. Não vi muita gente na rua, o que atribuí ao sol inclemente. Algumas áreas verdes, que parecem exigir trabalho para se manter. Muitos carros grandes. Grandes mesmo, bem maiores do que aqueles que a gente considera grandes aqui no Brasil. Alguns deles tinham placas coloridas. Uma picape gigante, vermelha, com a placa "ALL FUN" em cores de pôr do sol. Outros tinham placas em espanhol. Cidadãos com feições indígenas. Eu estava perto do Rio Grande (e ainda era vinte de setembro, o que me levou de volta a Porto Alegre). Faroeste contemporâneo, eu como forasteiro. Estranhei as casas de madeira em um lugar com tanto sol e temperatura relativamente alta. Mas o inverno deve ser frio.

Cheguei ao Hotel Blue, à beira do traçado urbano da Rota 66. Fiquei um pouco perdido ali na recepção, tímido de falar inglês sem saber qual sotaque usar. Me registrei, assinei com uma caneta de plástico em uma tela eletrônica. O chão do lobby era quadriculado em preto e branco, talvez uma citação aos anos sessenta. Algo de parque temático também. Peguei um par de cookies e subi ao quarto. O Hotel Blue deve ter passado por uma reforma e modernização em tempos recentes, mas tem um formato híbrido de hotel padrão com motel estadunidense - corredores externos e quartos voltados para fora. Bastante autonomia dentro do quarto: frigobar, máquina de café, microondas, tábua e ferro de passar roupa. Reservatórios práticos embutidos na parede oferecem sabonete líquido, shampoo e creme hidratante. Para o viajante não ter preocupações.

Fiquei fritando na cama por algum tempo. À tarde, a portaria me avisa que haviam chegado algumas encomendas. Eu havia comprado um substituto para meu laptop velho de guerra, e mais alguns eletrônicos que venderia na volta para ajudar a pagar pelo computador novo. Tinha feito um bom negócio, encomendando um laptop do ano anterior - já fora de linha por lá - pelo qual paguei mais ou menos metade do preço corrente no Brasil. Para evitar problemas na alfândega, havia deixado minha máquina antiga em casa e levado somente o HD em um case externo. Desci em instantes para descobrir o que havia chegado - um tablet e um smartphone, e nada do computador. Abri as embalagens, testei os equipamentos para ver se funcionavam. Tudo ok.

Por volta das seis da tarde, saí do hotel e fui até o centro histórico, "Old Town" de Albuquerque. Ao contrário do que eu imaginava, parecia um bairro cenográfico. Aquela cara de distrito turístico (mas não vi muitos turistas). Muitas lojas de souvenirs. Construções que sugeriam o estilo mexicano, um ou outro detalhe de filme americano - como as caixas de correio típicas ou aquela cerca de madeira de desenho animado - e muitos nomes em espanhol. Os cerca de dois quilômetros que percorri a pé para chegar lá eram desertos - vi passarem algumas dezenas de carros, e lembro de ter visto menos de meia dúzia de pessoas andando pelas ruas. A temperatura era agradável, tendendo ao quente. Fiquei circulando entre as estações de rádio locais: música mexicana, rap e a famosa NPR, rádio pública nacional. Em uma estação ouvi propaganda eleitoral contrária a Obama, em espanhol. Não tomei nota dos argumentos.

Cheguei no começo da noite ao Museu de Albuquerque, uma das sedes do ISEA. Tinha um pedaço daquela fauna de arte eletrônica que eu já conhecia de outros eventos. Visual moderninho, no meio do caminho entre a assimilação do espetáculo e a crítica intelectualizada. Peguei minhas credenciais. Flanei pelo ambiente, ainda cansado da viagem, até começar a tropeçar em conhecidos. Os brasileiros Rodrigo Minelli, Lucas Bambozzi e Bruno Vianna circulavam ali no saguão. Lenara Verle estava no café do Museu. Jaromil, comparsa de Bricolabs e outras redes, e Andres Burbano, o colombiano que me convidou ao ISEA, também circulavam. Subi para ver a obra de Bruno exposta no terraço do Museu: uma instalação que usava jatos de água reposicionados automaticamente como antenas para captar transmissões de satélite. Ao lado, um PC rodando Linux mostrava uma visualização dos satélites passando pelo céu naquele momento.

Havia sido convidado a jantar ali perto com algumas figuras importantes do mundo da arte/ciência/tecnologia, mas não me senti descansado o suficiente para encetar conversas conceituais aprofundadas em uma língua que não é a minha. Acabei tomando com Lucas o transporte oferecido pelo evento: um lindo e antigo ônibus escolar que nos levaria à abertura no 516 arts, galeria no centro da cidade. Bruno iria na bicicleta que alugara no lugar em que estava ficando. Já na entrada, encontramos os três gambiólogos. Já chegavam tirando onda: o Gambiociclo que fizeram nas semanas anteriores estava bem no hall da galeria. Lugar nobre. O ambiente estava lotado. Encontrei mais alguns conhecidos, mas o resquício de jet lag já estava me deixando em modo semi-social. O pessoal planejava sair de lá direto para uma microcervejaria local, mas acabei declinando. Voltei ao hotel com um cansaço pesado, mas ainda eram oito e pouco da noite. Encomendei pela internet um sanduíche de um lugar chamado Jimmy John's. Capotei às dez e pouco e só acordei às seis da manhã.

O café da manhã no Hotel Blue não tinha nenhum destaque. As opções eram o café de máquina (ruim, mas em compensação disponível o dia inteiro como os chás, sucos e cookies) e uma garrafa térmica com "café Starbucks" (regular). Sucos, pães, aquele iogurte com sabor de fruta sintética, etc. Uma TV gigante com o noticiário, focado principalmente na disputa pela presidência estadunidense.

Fui outra vez caminhando até o Museu de Albuquerque. Sol batendo forte. Me arrependi de não ter levado um chapéu. A cidade parecia vazia durante o dia também. Passei por duas escolas no caminho: uma parecia ter uma maioria de alunos latinos, a outra com crianças mais branquinhas e lourinhas. Na praça do centro histórico, uma bandinha de música mexicana parecia ensaiar para um casamento. Encontrei alguns pés floridos de lavanda, e em uma cerca topei com uvas pequenas e doces.

Cheguei para assistir ao painel sobre "Econotopias". Falariam Jaromil (sobre Bitcoin e Dyndy), Caroline Woolard (sobre a iniciativa Ourgoods) e Ted Howard (cooperativas Evergreen). Jaromil mencionou Marx, que apesar de fazer todo sentido para falar sobre valor e troca, soou algo estranho naquele lugar do mundo. Pensei sentir um incômodo no casal ao meu lado, mas pode ter sido mera impressão.

Jaromil fez uma crítica clara e contundente à sociedade atual, na qual "os humanos são o meio, e o objeto é o dinheiro". Descreveu o sistema financeiro como uma máquina complexa para representar afeto, valores, interesses e natureza em um jogo abstrato. Apresentou o Bitcoin, não sem criticar a dependência que a extração de coins tem de computadores poderosos - mas relativizou essa dependência, em comparação à dependência institucional de segurança das moedas nacionais. Posicionou o Bitcoin, ecoando o Chaos Computer Club, como exemplo de rede que resiste aos poderes centralizados/centralizadores.

Caroline Woolard apresentou o Ourgoods, que propõe uma economia de escambo para produtores culturais. Depreendi dali uma lógica de classificados, que lembrava o Bank of Common Knowledge do pessoal do Platoniq em Barcelona. Senti um aprisionamento forte ao mundo do espetáculo, ou à lógica do microespetáculo. Usava um monte de palavras corretas e aceitáveis nos dias de hoje. Construir uma cultura de cooperação. A economia não produz somente bens e serviços, também nos produz. Citou Paulo Freire - ação sem reflexão é cega, reflexão sem ação é impotente (traduzindo da tradução, posso ter perdido algo por aí).

Ted Howard veio contar sobre suas experiências incubando cooperativas nos EUA. Segundo o programa do ISEA, ele foi considerado em algum lugar como um dos "25 visionários que vão mudar o mundo". Ele fala bem, tem aquela postura profissional que só quem leva muito sério a própria pessoa consegue ter. Profissional ao extremo. Falou sobre a crescente disparidade social nos EUA. Citou estatísticas. Falou que o país tem 100 milhões de pessoas que podem ser consideradas pobres. Falou sobre a (sempre citada) cooperativa de Mondragon no País Basco. Descreveu sua estratégia para criar cooperativas nos EUA: encontrar uma instituição-âncora, criar um negócio cooperativo com a comunidade, crescer, conectar-se a setores em expansão, garantir financiamento. Era um discurso bem ensaiado e totalmente positivo, dentro de uma lógica específica. Mas tudo se resumia a criar novas maneiras de o cidadão comum estadunidense garantir seu emprego e continuar produzindo com menos intermediários (e mantendo seu padrão de vida, comprando seu 6-pack de Budweiser, comendo comida gordurosa e assistindo TV deitado no sofá).

Ao fim da apresentação de Ted Howard, um autoproclamado cientista mexicano o acusou de ingenuidade, ou de não estar falando a sério. Howard não discutiu. Jaromil pegou o microfone e sugeriu que cada povo precisa encontrar sua própria resposta. Naquele país, segundo ele, o contexto é diferente de lugares que foram colonizados. É necessário encontrar soluções autodeterminadas. Para Jaromil, nos EUA o capitalismo é visto como uma coisa boa, então eles precisam referir-se ao passado. Mas existiria algo comum entre os três projetos apresentados no painel - eles apontam para um futuro que se opõe à tendência política corrente, de austeridade como solução para as crises econômicas.

Outro senhor sugeriu a necessidade de criar um futuro novo e imprevisível. Jaromil argumentou que existe uma falha recorrente nas economias alternativas: tentar quantificar relacionamentos. Howard falou que é muito difícil pensar "além do capitalismo". Se você não gosta do socialismo de estado e não quer o capitalismo corporativo, o que pode fazer? Falou que nos EUA existe a impressão de que o capitalismo foi um presente enviado por deus. Meses depois, enquanto escrevo esse relato, acabei de terminar de ler o Futuros Imaginários de Richard Barbrook. E vem à minha mente a imagem do "marxismo sem Marx" que teria sido forjado nos EUA ao longo do século XX (junto à "cibernética sem Wiener" e ao "mcluhanismo sem McLuhan").

Desde a apresentação de Howard, passando pela intervenção do mexicano e até o fim da conversa, me atravessava uma sensação: eles não vão entender. É um sistema no qual todo discurso libertário já é automaticamente capturado ou enquadrado pelo mercado. Não existe saída naquele contexto. Me senti mais um peixe fora do aquário (mas a sensação não era nova).

Voltei ao hotel a pé, para descobrir se meu computador havia chegado. Nada. Já estava ficando preocupado: ele deveria estar no hotel um dia antes da minha chegada aos EUA. No caminho havia parado em um 7-11 para comprar cervejas e comida, mas não consegui (não lembro bem por quê - acho que estava sem meu passaporte ou havia esquecido o cartão). Fui dar uma volta perto da estação de trem, buscando alguma coisa para comer. Parei em um mexicano, peguei um burrito e um refrigerante gigantesco. Saí outra vez a pé. No caminho encontrei um caminhão da Fedex e perguntei ao motorista se era normal atrasar uma encomenda. O rapaz falou que não. Continuei até o hotel Albuquerque. Visitei o estande de uma editora, conversei com um engenheiro da Intel (que confessou que ia esperar até a chegada da segunda geração de Ultrabooks para ficar com um). Peguei um trecho da mesa "Authorlessness", interessante mas sem muita novidade. Um casamento acontecia no jardim do hotel.

Voltei ao Museu de Albuquerque, mas não encontrei ninguém. Aproveitando o wifi livre, encontrei pelo celular uma loja que alugava bicicletas. Caminhei até lá, debaixo de sol e calor, sonhando em pedalar e tomar vento na cara. Desisti ao saber do preço, 35 dólares por dia. Continuei andando em direção ao hotel e em uma esquina encontrei alguns conhecidos, que saíam de um debate sobre "economias alternativas" no Harwood Art Center. Segui o pessoal até um bar meio metido (não sem antes passarmos por um drive-thru de caixa eletrônico de banco, que deixou os europeus do grupo surpresos: "as pessoas não saem do carro nem para sacar dinheiro?"). No bar, conversamos em grupos até que um habitante de San Francisco (e lá isso tem um monte de significados adjacentes - meio hippie, meio de esquerda, simpático, tranquilo) sugeriu uma rodada geral de apresentações. Falei um pouco sobre o que estava fazendo ali, mas a sensação de estar em uma dinâmica de grupo (planejada, controlada, analisada) me espantou.

Voltei ao hotel para preparar minha apresentação para o painel da manhã de sábado. Liguei para a empresa que vendeu meu laptop, descobri que ao contrário do que eu havia requisitado - e pago -, eles não haviam enviado a encomenda por remessa expressa. Ela deveria estar no meio dos EUA, pelo correio comum. Chegaria na segunda-feira, a tempo de me encontrar no hotel, mas já depois das minhas duas apresentações. Recebi de volta o valor da entrega, e foi tudo que consegui. Teria que usar um dos computadores do lobby. Tentei subir o sistema do meu HD externo conectado via USB, mas não funcionou. Acabei usando o OpenOffice.org para Windows do computador do hotel. No processo, acabei perdendo a noite de Gala do ISEA. Mas consegui preparar a apresentação para a manhã seguinte. Depois saí, dei uma volta pelo centro, sondei alguns bares mas não tive vontade de entrar e beber sozinho. Voltei ao hotel e pedi outro sanduíche do mesmo lugar.

Segunda parte do relato sobre minha participação no ISEA, em setembro de 2012. Por enquanto vai sem os links mesmo. Assim que conseguir eu publico a terceira e última. Veja também: parte 1 e parte 3.Em algum ponto do relativamente curto trajeto entre Atlanta e Albuquerque, comecei a prestar atenção à paisagem pela janela do avião. O horizonte se elevava aos poucos, passando por bonitas rochas recortadas e continuando a subir. O verde dava lugar àquela cor avermelhada dos desertos do oeste estadunidense. Sobrevoando aquela amplidão seca, fiquei pensando sobre as dificuldades de fazer funcionar uma cidade contemporânea ali. A aridez só era cortada por ilhas verdes, provavelmente instalações agrícolas intensivas. Alguns açudes, cercados do que parecia ser areia. Imaginei o transporte de combustível pelo meio do deserto. O consumo, a logística. A guerra para sustentar esses fluxos.O aeroporto de Albuquerque (chamado Sunport, "porto do sol") poderia estar em alguma cidade turística litorânea. Cores fortes, uma luz quente vinda de fora. A influência mexicana é bem caracterizada, ao ponto da artificialidade - mais reconstrução do que herança. Encontrei um telefone público (que realmente tinha uma lista telefônica pendurada) e usei um quarto de dólar para ligar ao hotel requisitando o serviço de traslado. Em alguns minutos chegou uma van para me buscar. Espaçosa e silenciosa, como o próprio deserto havia parecido lá de cima. Lembrei de Jim Morrison fritando ao sol, viajando nos silêncios.A cidade é iluminada, sob um céu de azul intenso. Seria um período curto em Albuquerque - pouco mais do que os três dias que passei em Lisboa em 2006. Sabia que não conseguiria conhecer muito da cidade, mas queria pelo menos ter alguma impressão. Não vi muita gente na rua, o que atribuí ao sol inclemente. Algumas áreas verdes, que parecem exigir trabalho para se manter. Muitos carros grandes. Grandes mesmo, bem maiores do que aqueles que a gente considera grandes aqui no Brasil. Alguns deles tinham placas coloridas. Uma picape gigante, vermelha, com a placa "ALL FUN" em cores de pôr do sol. Outros tinham placas em espanhol. Cidadãos com feições indígenas. Eu estava perto do Rio Grande (e ainda era vinte de setembro, o que me levou de volta a Porto Alegre). Faroeste contemporâneo, eu como forasteiro. Estranhei as casas de madeira em um lugar com tanto sol e temperatura relativamente alta. Mas o inverno deve ser frio.Cheguei ao Hotel Blue, à beira do traçado urbano da Rota 66. Fiquei um pouco perdido ali na recepção, tímido de falar inglês sem saber qual sotaque usar. Me registrei, assinei com uma caneta de plástico em uma tela eletrônica. O chão do lobby era quadriculado em preto e branco, talvez uma citação aos anos sessenta. Algo de parque temático também. Peguei um par de cookies e subi ao quarto. O Hotel Blue deve ter passado por uma reforma e modernização em tempos recentes, mas tem um formato híbrido de hotel padrão com motel estadunidense - corredores externos e quartos voltados para fora. Bastante autonomia dentro do quarto: frigobar, máquina de café, microondas, tábua e ferro de passar roupa. Reservatórios práticos embutidos na parede oferecem sabonete líquido, shampoo e creme hidratante. Para o viajante não ter preocupações.Fiquei fritando na cama por algum tempo. À tarde, a portaria me avisa que haviam chegado algumas encomendas. Eu havia comprado um substituto para meu laptop velho de guerra, e mais alguns eletrônicos que venderia na volta para ajudar a pagar pelo computador novo. Tinha feito um bom negócio, encomendando um laptop do ano anterior - já fora de linha por lá - pelo qual paguei mais ou menos metade do preço corrente no Brasil. Para evitar problemas na alfândega, havia deixado minha máquina antiga em casa e levado somente o HD em um case externo. Desci em instantes para descobrir o que havia chegado - um tablet e um smartphone, e nada do computador. Abri as embalagens, testei os equipamentos para ver se funcionavam. Tudo ok.Por volta das seis da tarde, saí do hotel e fui até o centro histórico, "Old Town" de Albuquerque. Ao contrário do que eu imaginava, parecia um bairro cenográfico. Aquela cara de distrito turístico (mas não vi muitos turistas). Muitas lojas de souvenirs. Construções que sugeriam o estilo mexicano, um ou outro detalhe de filme americano - como as caixas de correio típicas ou aquela cerca de madeira de desenho animado - e muitos nomes em espanhol. Os cerca de dois quilômetros que percorri a pé para chegar lá eram desertos - vi passarem algumas dezenas de carros, e lembro de ter visto menos de meia dúzia de pessoas andando pelas ruas. A temperatura era agradável, tendendo ao quente. Fiquei circulando entre as estações de rádio locais: música mexicana, rap e a famosa NPR, rádio pública nacional. Em uma estação ouvi propaganda eleitoral contrária a Obama, em espanhol. Não tomei nota dos argumentos.Cheguei no começo da noite ao Museu de Albuquerque, uma das sedes do ISEA. Tinha um pedaço daquela fauna de arte eletrônica que eu já conhecia de outros eventos. Visual moderninho, no meio do caminho entre a assimilação do espetáculo e a crítica intelectualizada. Peguei minhas credenciais. Flanei pelo ambiente, ainda cansado da viagem, até começar a tropeçar em conhecidos. Os brasileiros Rodrigo Minelli, Lucas Bambozzi e Bruno Vianna circulavam ali no saguão. Lenara Verle estava no café do Museu. Jaromil, comparsa de Bricolabs e outras redes, e Andres Burbano, o colombiano que me convidou ao ISEA, também circulavam. Subi para ver a obra de Bruno exposta no terraço do Museu: uma instalação que usava jatos de água reposicionados automaticamente como antenas para captar transmissões de satélite. Ao lado, um PC rodando Linux mostrava uma visualização dos satélites passando pelo céu naquele momento.Havia sido convidado a jantar ali perto com algumas figuras importantes do mundo da arte/ciência/tecnologia, mas não me senti descansado o suficiente para encetar conversas conceituais aprofundadas em uma língua que não é a minha. Acabei tomando com Lucas o transporte oferecido pelo evento: um lindo e antigo ônibus escolar que nos levaria à abertura no 516 arts, galeria no centro da cidade. Bruno iria na bicicleta que alugara no lugar em que estava ficando. Já na entrada, encontramos os três gambiólogos. Já chegavam tirando onda: o Gambiociclo que fizeram nas semanas anteriores estava bem no hall da galeria. Lugar nobre. O ambiente estava lotado. Encontrei mais alguns conhecidos, mas o resquício de jet lag já estava me deixando em modo semi-social. O pessoal planejava sair de lá direto para uma microcervejaria local, mas acabei declinando. Voltei ao hotel com um cansaço pesado, mas ainda eram oito e pouco da noite. Encomendei pela internet um sanduíche de um lugar chamado Jimmy John's. Capotei às dez e pouco e só acordei às seis da manhã.O café da manhã no Hotel Blue não tinha nenhum destaque. As opções eram o café de máquina (ruim, mas em compensação disponível o dia inteiro como os chás, sucos e cookies) e uma garrafa térmica com "café Starbucks" (regular). Sucos, pães, aquele iogurte com sabor de fruta sintética, etc. Uma TV gigante com o noticiário, focado principalmente na disputa pela presidência estadunidense.Fui outra vez caminhando até o Museu de Albuquerque. Sol batendo forte. Me arrependi de não ter levado um chapéu. A cidade parecia vazia durante o dia também. Passei por duas escolas no caminho: uma parecia ter uma maioria de alunos latinos, a outra com crianças mais branquinhas e lourinhas. Na praça do centro histórico, uma bandinha de música mexicana parecia ensaiar para um casamento. Encontrei alguns pés floridos de lavanda, e em uma cerca topei com uvas pequenas e doces.Cheguei para assistir ao painel sobre "Econotopias". Falariam Jaromil (sobre Bitcoin e Dyndy), Caroline Woolard (sobre a iniciativa Ourgoods) e Ted Howard (cooperativas Evergreen). Jaromil mencionou Marx, que apesar de fazer todo sentido para falar sobre valor e troca, soou algo estranho naquele lugar do mundo. Pensei sentir um incômodo no casal ao meu lado, mas pode ter sido mera impressão.Jaromil fez uma crítica clara e contundente à sociedade atual, na qual "os humanos são o meio, e o objeto é o dinheiro". Descreveu o sistema financeiro como uma máquina complexa para representar afeto, valores, interesses e natureza em um jogo abstrato. Apresentou o Bitcoin, não sem criticar a dependência que a extração de coins tem de computadores poderosos - mas relativizou essa dependência, em comparação à dependência institucional de segurança das moedas nacionais. Posicionou o Bitcoin, ecoando o Chaos Computer Club, como exemplo de rede que resiste aos poderes centralizados/centralizadores.Caroline Woolard apresentou o Ourgoods, que propõe uma economia de escambo para produtores culturais. Depreendi dali uma lógica de classificados, que lembrava o Bank of Common Knowledge do pessoal do Platoniq em Barcelona. Senti um aprisionamento forte ao mundo do espetáculo, ou à lógica do microespetáculo. Usava um monte de palavras corretas e aceitáveis nos dias de hoje. Construir uma cultura de cooperação. A economia não produz somente bens e serviços, também nos produz. Citou Paulo Freire - ação sem reflexão é cega, reflexão sem ação é impotente (traduzindo da tradução, posso ter perdido algo por aí).Ted Howard veio contar sobre suas experiências incubando cooperativas nos EUA. Segundo o programa do ISEA, ele foi considerado em algum lugar como um dos "25 visionários que vão mudar o mundo". Ele fala bem, tem aquela postura profissional que só quem leva muito sério a própria pessoa consegue ter. Profissional ao extremo. Falou sobre a crescente disparidade social nos EUA. Citou estatísticas. Falou que o país tem 100 milhões de pessoas que podem ser consideradas pobres. Falou sobre a (sempre citada) cooperativa de Mondragon no País Basco. Descreveu sua estratégia para criar cooperativas nos EUA: encontrar uma instituição-âncora, criar um negócio cooperativo com a comunidade, crescer, conectar-se a setores em expansão, garantir financiamento. Era um discurso bem ensaiado e totalmente positivo, dentro de uma lógica específica. Mas tudo se resumia a criar novas maneiras de o cidadão comum estadunidense garantir seu emprego e continuar produzindo com menos intermediários (e mantendo seu padrão de vida, comprando seu 6-pack de Budweiser, comendo comida gordurosa e assistindo TV deitado no sofá).Ao fim da apresentação de Ted Howard, um autoproclamado cientista mexicano o acusou de ingenuidade, ou de não estar falando a sério. Howard não discutiu. Jaromil pegou o microfone e sugeriu que cada povo precisa encontrar sua própria resposta. Naquele país, segundo ele, o contexto é diferente de lugares que foram colonizados. É necessário encontrar soluções autodeterminadas. Para Jaromil, nos EUA o capitalismo é visto como uma coisa boa, então eles precisam referir-se ao passado. Mas existiria algo comum entre os três projetos apresentados no painel - eles apontam para um futuro que se opõe à tendência política corrente, de austeridade como solução para as crises econômicas.Outro senhor sugeriu a necessidade de criar um futuro novo e imprevisível. Jaromil argumentou que existe uma falha recorrente nas economias alternativas: tentar quantificar relacionamentos. Howard falou que é muito difícil pensar "além do capitalismo". Se você não gosta do socialismo de estado e não quer o capitalismo corporativo, o que pode fazer? Falou que nos EUA existe a impressão de que o capitalismo foi um presente enviado por deus. Meses depois, enquanto escrevo esse relato, acabei de terminar de ler o Futuros Imaginários de Richard Barbrook. E vem à minha mente a imagem do "marxismo sem Marx" que teria sido forjado nos EUA ao longo do século XX (junto à "cibernética sem Wiener" e ao "mcluhanismo sem McLuhan").Desde a apresentação de Howard, passando pela intervenção do mexicano e até o fim da conversa, me atravessava uma sensação: eles não vão entender. É um sistema no qual todo discurso libertário já é automaticamente capturado ou enquadrado pelo mercado. Não existe saída naquele contexto. Me senti mais um peixe fora do aquário (mas a sensação não era nova).Voltei ao hotel a pé, para descobrir se meu computador havia chegado. Nada. Já estava ficando preocupado: ele deveria estar no hotel um dia antes da minha chegada aos EUA. No caminho havia parado em um 7-11 para comprar cervejas e comida, mas não consegui (não lembro bem por quê - acho que estava sem meu passaporte ou havia esquecido o cartão). Fui dar uma volta perto da estação de trem, buscando alguma coisa para comer. Parei em um mexicano, peguei um burrito e um refrigerante gigantesco. Saí outra vez a pé. No caminho encontrei um caminhão da Fedex e perguntei ao motorista se era normal atrasar uma encomenda. O rapaz falou que não. Continuei até o hotel Albuquerque. Visitei o estande de uma editora, conversei com um engenheiro da Intel (que confessou que ia esperar até a chegada da segunda geração de Ultrabooks para ficar com um). Peguei um trecho da mesa "Authorlessness", interessante mas sem muita novidade. Um casamento acontecia no jardim do hotel.Voltei ao Museu de Albuquerque, mas não encontrei ninguém. Aproveitando o wifi livre, encontrei pelo celular uma loja que alugava bicicletas. Caminhei até lá, debaixo de sol e calor, sonhando em pedalar e tomar vento na cara. Desisti ao saber do preço, 35 dólares por dia. Continuei andando em direção ao hotel e em uma esquina encontrei alguns conhecidos, que saíam de um debate sobre "economias alternativas" no Harwood Art Center. Segui o pessoal até um bar meio metido (não sem antes passarmos por um drive-thru de caixa eletrônico de banco, que deixou os europeus do grupo surpresos: "as pessoas não saem do carro nem para sacar dinheiro?"). No bar, conversamos em grupos até que um habitante de San Francisco (e lá isso tem um monte de significados adjacentes - meio hippie, meio de esquerda, simpático, tranquilo) sugeriu uma rodada geral de apresentações. Falei um pouco sobre o que estava fazendo ali, mas a sensação de estar em uma dinâmica de grupo (planejada, controlada, analisada) me espantou.Voltei ao hotel para preparar minha apresentação para o painel da manhã de sábado. Liguei para a empresa que vendeu meu laptop, descobri que ao contrário do que eu havia requisitado - e pago -, eles não haviam enviado a encomenda por remessa expressa. Ela deveria estar no meio dos EUA, pelo correio comum. Chegaria na segunda-feira, a tempo de me encontrar no hotel, mas já depois das minhas duas apresentações. Recebi de volta o valor da entrega, e foi tudo que consegui. Teria que usar um dos computadores do lobby. Tentei subir o sistema do meu HD externo conectado via USB, mas não funcionou. Acabei usando o OpenOffice.org para Windows do computador do hotel. No processo, acabei perdendo a noite de Gala do ISEA. Mas consegui preparar a apresentação para a manhã seguinte. Depois saí, dei uma volta pelo centro, sondei alguns bares mas não tive vontade de entrar e beber sozinho. Voltei ao hotel e pedi outro sanduíche do mesmo lugar.
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Diário do ventre da besta - parte 1

sex, 30/11/2012 - 16:49

Primeira parte (de um total ainda não estimado) do relato sobre minha participação no ISEA, setembro passado, em Albuquerque, Estados Unidos. Estava tentando terminar o texto antes de publicar, mas fazem semanas que ele congelou. Envio assim para esquecer esse começo e respirar um pouco.

Atualizando: veja a parte 2 e a parte 3.

Recostado em uma cadeira pouco confortável do aeroporto de Atlanta, vi o sol nascer alguns minutos após as sete da manhã, horário local. A data, vinte de setembro, me fez pensar na aurora precursora do farol da divindade que abre o hino do Rio Grande do Sul. Um dia me disseram que a cultura gauchesca foi um movimento artificial, articulado por uma classe média urbana em busca de identidade. Lembrei disso ali naquele aeroporto, olhando para os senhores de meia idade vestindo chapéus de cowboy como se não os tirassem nem para dormir, mesmo que a pele branca e fina sugira que não tomam sol há tempos. Até que ponto o cinema de faroeste foi uma influência para que os gaúchos urbanos quisessem buscar a imagem do tipo rude do campo para forjar sua identidade? Qual a profundidade dos tentáculos do império? Era minha primeira vez naquelas terras. Voltei com muito mais perguntas do que respostas. Passados mais de dois meses, faço aqui um esforço para documentar a viagem.

"Aproveitem a Babilônia e o ventre da fera… em tempos de eleição…", dizia a mensagem enviada por um local em meados de setembro à lista Bricolabs, dirigida a mim e outros comparsas a caminho dos Estados Unidos (um artista indonésio, um hacker siciliano, uma produtora chilena, entre outrxs). Acho que é impossível chegar aos Estados Unidos sem preconceitos. Minha formação "cultural" apoiada pela indústria de entretenimento carrega um monte de atitudes, trejeitos e sotaques estadunidenses. E os clichês aparecem de fato. A banca de revistas, naturalmente, só tem revistas estadunidenses. Parece até ridículo esperar revistas de diversos países, como em qualquer outro aeroporto do mundo. Para a esmagadora maioria daquela população, os Estados Unidos não são o centro do mundo: os Estados Unidos são o mundo e ponto. Não existe exterior, só Paris (um parque temático) e Londres (museu pré-histórico). O resto é quintal.

No dia da partida acordei cedo. Faria calor em sampa (bateu nos 34 graus, e ainda nem tinha virado primavera). Saí bem cedo para compensar o péssimo trânsito. O ônibus demorou 74 minutos entre o Aeroporto de Congonhas e a saída para a Marginal Tietê. No total, quase duas horas.

O trecho entre Guarulhos e Atlanta foi tranquilo. Espaço entre poltronas razoável, comida regular. O fone de ouvido era horrível, acabei usando os do meu celular. Avistei uma amiga, algumas fileiras à frente no mesmo avião. A meu lado viajava um estudante de engenharia mineiro, bolsista do programa Ciência sem fronteiras, a caminho de Seattle. Era seu primeiro voo de longa distância. Estávamos cercados (ao lado, na frente e atrás) por mórmons a caráter, o que se repetiria no meu voo de volta ao Brasil. Simpáticos e sorridentes, sempre puxando assunto em um português enrolado. Muito brancos, algo avermelhados pelo sol tropical.

Já em solo estadunidense, a fila da alfândega se dobrava em ziguezague. Vários tipos brasileiros por ali: adolescentes a caminho da Disney; a perua reclamando com a amiga da proximidade com o restante do povo; o playboy mineiro carregando a contragosto a volumosa bagagem de mão da namorada, que tentou deixar no meio da fila para coletar na volta mas voltou atrás quando os seguranças do aeroporto demonstraram preocupação. Viajando sozinho, as idas e voltas da fila acabaram me trazendo alguma familiaridade com aquelas pessoas. Dava para ver quem estava nervoso, com medo de chegar no guichê. Achei curioso que eles disponibilizem intérpretes para quem não fala inglês, constantemente chamados pelo alto-falante. Talvez seja prática corrente em outros países, mas confesso que nunca percebi de modo tão explícito. Também chamou minha atenção o altíssimo pé-direito na área da fila, diferente de experiências mais claustrofóbicas em outros aeroportos. O agente da alfândega não me deu maior problema, depois que mostrei os convites, reserva do hotel e passagem de volta.

Os terminais do aeroporto são conectados por um trem subterrâneo sem tripulantes, como em Zurich. O trem parece recente. Não queria comer muita coisa, e acabei pegando um pacote de batata frita e um suco artificial que lembrava o brasileiro Tampico. Péssima escolha, deixei os dois pela metade. Em meras três horas esperando o voo seguinte, não tive a oportunidade de conhecer Atlanta, uma cidade da qual a única informação que tenho - também adquirida pela indústria do entretenimento - é ser capital da Georgia, estado que baniu as apresentações de Ray Charles no ápice do apartheid sulista. Sei também que Atlanta sediou as Olimpíadas de 1996. Pensei em Barcelona, a sensação de vazio no bairro olímpico. Pensei no Rio. Percebi muitos negros e negras trabalhando nos serviços básicos do aeroporto. Muito mais do que na média dos aeroportos brasileiros, diga-se de passagem. Por outro lado, também notei a ausência de tonalidades intermediárias de pele. Costuma-se repetir que nos EUA existem menos casamentos interraciais. A paisagem humana dentro do aeroporto parecia uma confirmação disso.

Algumas recorrências de clichês eram quase caricaturais. A mulher cheia de penduricalhos dourados falando alto ao telefone com um enrolado sotaque sulista - não era uma sátira, ou pelo menos não intencionalmente. A paranoia de segurança, que já começa antes mesmo do embarque no Brasil com atenção redobrada à identificação do passageiro, além do infame saquinho plástico para separar os líquidos carregados na bagagem de mão, e se estende já em solo americano ao detector de metais de corpo inteiro que evoca aquelas máquinas de Raio X de Total Recall. A impressão de que aquelas pessoas sentem-se verdadeiramente no centro de um mundo cuja dimensão ignoram: são o otimista povo superior que habita a terra escolhida, e têm por missão assegurar um futuro próspero para o mundo livre.

Logo estava embarcando para continuar a viagem. Rumava a Albuquerque, no Novo México, que sediaria a 18a edição do Simpósio Internacional de Arte Eletrônica (ISEA). O tema para este ano era "Machine wilderness", algo como "deserto das máquinas". Fui convidado por Andres Burbano, que coordenava o Fórum Latinoamericano do ISEA, a participar de um painel sobre mapeamento colaborativo e moderar um debate sobre "laboratórios abertos em tempos pós-digitais". Estava lá com o apoio do Edital de Intercâmbio do Ministério da Cultura brasileiro, e levava comigo algumas cópias do meu livro e um flyer em inglês, graças à ajuda do coletivo MutGamb.

Primeira parte (de um total ainda não estimado) do relato sobre minha participação no ISEA, setembro passado, em Albuquerque, Estados Unidos. Estava tentando terminar o texto antes de publicar, mas fazem semanas que ele congelou. Envio assim para esquecer esse começo e respirar um pouco. Atualizando: veja a parte 2 e a parte 3.Recostado em uma cadeira pouco confortável do aeroporto de Atlanta, vi o sol nascer alguns minutos após as sete da manhã, horário local. A data, vinte de setembro, me fez pensar na aurora precursora do farol da divindade que abre o hino do Rio Grande do Sul. Um dia me disseram que a cultura gauchesca foi um movimento artificial, articulado por uma classe média urbana em busca de identidade. Lembrei disso ali naquele aeroporto, olhando para os senhores de meia idade vestindo chapéus de cowboy como se não os tirassem nem para dormir, mesmo que a pele branca e fina sugira que não tomam sol há tempos. Até que ponto o cinema de faroeste foi uma influência para que os gaúchos urbanos quisessem buscar a imagem do tipo rude do campo para forjar sua identidade? Qual a profundidade dos tentáculos do império? Era minha primeira vez naquelas terras. Voltei com muito mais perguntas do que respostas. Passados mais de dois meses, faço aqui um esforço para documentar a viagem."Aproveitem a Babilônia e o ventre da fera… em tempos de eleição…", dizia a mensagem enviada por um local em meados de setembro à lista Bricolabs, dirigida a mim e outros comparsas a caminho dos Estados Unidos (um artista indonésio, um hacker siciliano, uma produtora chilena, entre outrxs). Acho que é impossível chegar aos Estados Unidos sem preconceitos. Minha formação "cultural" apoiada pela indústria de entretenimento carrega um monte de atitudes, trejeitos e sotaques estadunidenses. E os clichês aparecem de fato. A banca de revistas, naturalmente, só tem revistas estadunidenses. Parece até ridículo esperar revistas de diversos países, como em qualquer outro aeroporto do mundo. Para a esmagadora maioria daquela população, os Estados Unidos não são o centro do mundo: os Estados Unidos são o mundo e ponto. Não existe exterior, só Paris (um parque temático) e Londres (museu pré-histórico). O resto é quintal.No dia da partida acordei cedo. Faria calor em sampa (bateu nos 34 graus, e ainda nem tinha virado primavera). Saí bem cedo para compensar o péssimo trânsito. O ônibus demorou 74 minutos entre o Aeroporto de Congonhas e a saída para a Marginal Tietê. No total, quase duas horas.O trecho entre Guarulhos e Atlanta foi tranquilo. Espaço entre poltronas razoável, comida regular. O fone de ouvido era horrível, acabei usando os do meu celular. Avistei uma amiga, algumas fileiras à frente no mesmo avião. A meu lado viajava um estudante de engenharia mineiro, bolsista do programa Ciência sem fronteiras, a caminho de Seattle. Era seu primeiro voo de longa distância. Estávamos cercados (ao lado, na frente e atrás) por mórmons a caráter, o que se repetiria no meu voo de volta ao Brasil. Simpáticos e sorridentes, sempre puxando assunto em um português enrolado. Muito brancos, algo avermelhados pelo sol tropical.Já em solo estadunidense, a fila da alfândega se dobrava em ziguezague. Vários tipos brasileiros por ali: adolescentes a caminho da Disney; a perua reclamando com a amiga da proximidade com o restante do povo; o playboy mineiro carregando a contragosto a volumosa bagagem de mão da namorada, que tentou deixar no meio da fila para coletar na volta mas voltou atrás quando os seguranças do aeroporto demonstraram preocupação. Viajando sozinho, as idas e voltas da fila acabaram me trazendo alguma familiaridade com aquelas pessoas. Dava para ver quem estava nervoso, com medo de chegar no guichê. Achei curioso que eles disponibilizem intérpretes para quem não fala inglês, constantemente chamados pelo alto-falante. Talvez seja prática corrente em outros países, mas confesso que nunca percebi de modo tão explícito. Também chamou minha atenção o altíssimo pé-direito na área da fila, diferente de experiências mais claustrofóbicas em outros aeroportos. O agente da alfândega não me deu maior problema, depois que mostrei os convites, reserva do hotel e passagem de volta.Os terminais do aeroporto são conectados por um trem subterrâneo sem tripulantes, como em Zurich. O trem parece recente. Não queria comer muita coisa, e acabei pegando um pacote de batata frita e um suco artificial que lembrava o brasileiro Tampico. Péssima escolha, deixei os dois pela metade. Em meras três horas esperando o voo seguinte, não tive a oportunidade de conhecer Atlanta, uma cidade da qual a única informação que tenho - também adquirida pela indústria do entretenimento - é ser capital da Georgia, estado que baniu as apresentações de Ray Charles no ápice do apartheid sulista. Sei também que Atlanta sediou as Olimpíadas de 1996. Pensei em Barcelona, a sensação de vazio no bairro olímpico. Pensei no Rio. Percebi muitos negros e negras trabalhando nos serviços básicos do aeroporto. Muito mais do que na média dos aeroportos brasileiros, diga-se de passagem. Por outro lado, também notei a ausência de tonalidades intermediárias de pele. Costuma-se repetir que nos EUA existem menos casamentos interraciais. A paisagem humana dentro do aeroporto parecia uma confirmação disso.Algumas recorrências de clichês eram quase caricaturais. A mulher cheia de penduricalhos dourados falando alto ao telefone com um enrolado sotaque sulista - não era uma sátira, ou pelo menos não intencionalmente. A paranoia de segurança, que já começa antes mesmo do embarque no Brasil com atenção redobrada à identificação do passageiro, além do infame saquinho plástico para separar os líquidos carregados na bagagem de mão, e se estende já em solo americano ao detector de metais de corpo inteiro que evoca aquelas máquinas de Raio X de Total Recall. A impressão de que aquelas pessoas sentem-se verdadeiramente no centro de um mundo cuja dimensão ignoram: são o otimista povo superior que habita a terra escolhida, e têm por missão assegurar um futuro próspero para o mundo livre.Logo estava embarcando para continuar a viagem. Rumava a Albuquerque, no Novo México, que sediaria a 18a edição do Simpósio Internacional de Arte Eletrônica (ISEA). O tema para este ano era "Machine wilderness", algo como "deserto das máquinas". Fui convidado por Andres Burbano, que coordenava o Fórum Latinoamericano do ISEA, a participar de um painel sobre mapeamento colaborativo e moderar um debate sobre "laboratórios abertos em tempos pós-digitais". Estava lá com o apoio do Edital de Intercâmbio do Ministério da Cultura brasileiro, e levava comigo algumas cópias do meu livro e um flyer em inglês, graças à ajuda do coletivo MutGamb.
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Crazy

qua, 28/11/2012 - 14:38

Vinicius Senger, fundador da Globalcode e morador de Ubatuba, publicou a primeira edição do videocast We are crazy, falando sobre robótica com Raspberry Pi e Arduino.

Vinicius Senger, fundador da Globalcode e morador de Ubatuba, publicou a primeira edição do videocast We are crazy, falando sobre robótica com Raspberry Pi e Arduino.
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